A Constituição Federal protege o direito autoral como cláusula pétrea, estabelecendo em seu artigo 5º, inciso XXVII, que aos autores pertence o direito exclusivo de utilização, mandamento reeditado na Lei de Direito Autoral, que prevê que as autorizações dos titulares para uso de obras intelectuais devem ser sempre prévias e expressas.
O entendimento é da 6ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo ao condenar a Rede Globo a indenizar uma professora por reproduzir uma música de sua autoria, sem autorização, durante o Big Brother Brasil.
Na ação, a professora afirmou que produz conteúdo audiovisual em um canal do Youtube, onde divulga trabalhos como compositora e intérprete de músicas. Titular dos direitos autorais de uma música chamada "despedida", ela disse que a obra foi reproduzida no programa da Globo sem sua autorização e sem os devidos créditos.
Em primeiro grau, a emissora foi condenada a indenizar em R$ 15 mil por danos morais, além de danos materiais a serem apurados em fase de liquidação de sentença. Ao TJ-SP, a Globo disse que, após reproduzir 21 segundos da música no BBB, procurou editoras para identificar a compositora, emitir a autorização de uso e proceder o pagamento dos direitos (de R$ 758,60), mas não a encontrou.
Para a emissora, o fato de ter buscado a titular dos direitos autorais da música já demonstraria sua boa-fé na solução da questão. Porém, ao negar o recurso da Globo, o relator, desembargador Costa Netto, disse que "não convence" o argumento de que a emissora tentou localizar a autora da obra musical.
Para ele, uma simples busca na internet já daria pistas sobre a compositora. "Não se pode crer que um programa como Big Brother Brasil, veiculado pela empresa de comunicação do porte da ré, Grupo Globo, possa ser inexperiente a ponto de ignorar a existência do trabalho de (no mínimo) um autor na criação de uma obra musical", afirmou.
Netto disse que a Globo agiu de "forma temerária" e com "descaso" ao violar os direitos autorais da professora, "que tem vasta produção audiovisual em seu canal no Youtube, local em que divulga seus trabalhos como compositora e intérprete".
Além disso, o magistrado afastou outro argumento da Globo de que usou apenas "um pequeno trecho" da música, o que dispensaria a autorização prévia e expressa. Para ele, a reprodução da música se deu em contexto relevante do programa, na eliminação de um participante, e não teve caráter secundário, como alegado pela emissora.
"Consequentemente, a utilização indevida da música sem a autorização da titular e sem a atribuição dos devidos créditos de autoria, fato reconhecido pela ré, viola os direitos autorais, sendo de rigor a indenização pelos danos decorrentes", concluiu o relator, ao majorar a reparação por danos morais para R$ 20 mil.
Despedida do BBB
O desembargador reformou em parte a sentença de primeira instância com relação aos danos materiais. Ele disse que o uso de uma música chamada "despedida" justamente em dia de eliminação no BBB "assumiu papel de destaque ao completar o programa que era dedicado a saída de um dos participantes; era um programa de despedida".
Assim, para Netto, a reprodução da música merece tratamento jurídico semelhante ao da sincronização: "Nesses casos não há, propriamente, uma 'sincronização' (de sons e imagens, por exemplo), mas sim o ato de a obra intelectual ser incluída no todo ou em parte, em determinado contexto".
Para o relator, os critérios para a indenização por danos materiais devem considerar o proveito econômico obtido pelo programa, isto é, cada segundo do trecho reproduzido da música corresponderá a 10% do valor de cada segundo da tabela de publicidade da Globo, válida para o território nacional, aplicável ao programa BBB. A decisão foi unânime.
1002488-76.2019.8.26.0637
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